segunda-feira, 7 de julho de 2014

O Abandono da Sintaxe

Sim, deixa essas tuas palavras sem sentido
Esquecidas na dispensa

Faz delas não mais que um objeto indesejado
Que relíquias de um mundo descartável
Que no fim
Elas não podem ser mais que isso

Deixa que tomem poeira e se apodreçam
Deixa que se contorçam e se caiam e se e se
Se percam se
Fossem mais
Não se não se
Destruam-se
Mas se apaguem

Dorme teus verbos
Dilui teus substantivos

Deixa que despenquem da tua língua
Para o abismo do riso
Para o abismo do
O que significa
isso?

Que as mais belas juras de amor que ressoaram sobre as sílabas desses vocábulos perdidos
Nunca poderão ser sentidas novamente
Nunca poderão ser ditas da mesma forma

Sei que queres ver que se desmembre o idioma
No qual xingaram a tua mãe e o teu filho
Que te importa?
Que diferença te faz se já não pensas?

Acetábulo batanca canídeo carveol clamator eslaide filosofema káon micondó odivelense redarguir retopexia redaximar sageza sairuçi siparuna hadoque vetusto extirpável convício baselácea mariseira opistocifose paracaxi pleitear protombina saninaua taraxaco tiquira inhambuanhanga gazofilácio embiópteros

Sinovial sinóvia sinrizo sinsépalo sintático sintagma sintagmatarca sintagmático sintática sintático

Sintaxe

Todas elas jazendo nesse cemitério
Que falas

Para de fingir tua pena
E abandona tua sintaxe
Frágil, indefesa, enroladinha num manto
Na porta de uma casa que vai cuidar dela
Que vai acariciar seus fonemas numa noite escura
E pra ela dormir vai contar histórias sobre um tempo
Bom onde os homens conversavam em suas palavras
Discutiam em suas junções
Brincavam com suas construções
Poetavam com suas frases mais bonitinhas
(Ai!)
Pragueavam em suas exclamações mais chulas
(Caralho!)
E sentiam o peso imenso de suas sentenças mais curtas
(Sim!)

E ela vai acordar sonhando
Com os falantes que não ouve há muito e muito tempo

Sim, abandona tua sintaxe
E vai buscar algo que o valha
Nessa teu mundo alternativo da comunicação ultra-veloz e muito maravilhosa em que não cansas de cansar teus dedos frenéticos nas telas que cabem no seu bolso do novo século

Mas não destrói essas palavras não!

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