terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Delírio

A sorte e as desventuras da morte
Que trazem consigo nobres consortes
Conseguem trazer consigo um febril
Sentimento de completude insano

Sem querer ser, de si mesmo, chefia,
O poder imperativo trazia
Algo como uma cegueira senil,
Sem um centavo cravado de dano

Imortal, homem sente-se incapaz
E aos montes somem, com o mais sagaz:
Pôde convencer a todos que viu
A revelação do final humano

Sem pobreza, azar, sem fortuna forte,
Os crentes, sem memória (só recortes)
Seguiam o tal visionário vil
Sem noção ter do perigoso plano

E era o presságio, tal líder mortal
Encarnava a própria morte e seu mal
Levava os bípedes a um eclipse
Formando, da verdade, o apocalipse.

sábado, 21 de dezembro de 2013

Soneto da Desintegração

Quando a noite chegar, vou ser sincero,
Pretendo desmembrar os meus tecidos
Inflamando meus sórdidos sentidos
Como o incêndio de Roma fez com Nero

Quando a noite chegar, direi que quero
Desintegrar meu corpo estremecido
Desmanchar cada próton escondido
De cada um dos meus átomos austeros

Quando a noite chegar (ela está vindo!)
Todos veremos, bêbados da vida,
A sombra amarga da luz da existência

Olá noite! Hoje o dia foi tão lindo
Triste dizer adeus... Então, querida,
Devaste, escombre, quebre-me a consciência!

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Esquadro

Me disse o meu amigo, me disse uma prosa
De que o mundo, na verdade, não era assim tão cor-de-rosa
Que as rosas portavam os espinhos que traziam o veneno
Mas que o veneno poderia ser, também, o néctar mais pleno

Disse ele que os planos terrestres podem ser mais que imaginamos
Ou menos, até. Poderíamos ser somente ramos
De incríveis florestas contêineres de universos
De impossíveis peripécias então contadas em versos

Mas tal amigo decidiu avisar para um perigo
(Mais sabe ele de tudo isso do que guardo comigo)
Que seria uma simples e humana inversão
Avisou: "Tome cuidado, meu caro. Tome cuidado com a emoção!"

E então que as histórias começaram a não fazer sentido
Como humano sou se há tempos não venho sentindo
O calor ou o frio na nossa calma alma?
Será que sofre meu amigo da ilusão do final?

Tortura

Cortas-me o coração; eu sei que o fazes
Com gosto e com desejo de tortura
Nada te agrada mais que a desventura
De meu peito comido por antrazes

Pega-o, desmembra-o, esmaga-o - que não trazes
Nada que chegue perto da amargura
Que tu causaste - e toma-o com tenazes
Depois joga-o no abismo da loucura

E vendo-o, semimorto e destruído,
Olha as desilusões que provocaste
Sem que tivesse ao menos merecido

Porque toda essa dor, todo o martírio
(ele te amou, foi tu que não amaste)
Pulsou sangrando apenas num delírio

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Ladrão de Jornais

Hoje é domingo, cachimbo quebrou
O hino ali então cantado em rock'n'roll
Meninos levando a si sua vitória
Cantando e contando suas simples glórias

O estandarte de pano que clamou
O território que a estrada roubou
Apagando os registros da memória
Relevando os sacrifícios da história

Os romances e as nuances da vida
À escalada ao nosso sofrível mérito
Absortos, na distância do momento

A vida do ladrão não é sofrida
Enquanto não exala sentimento
E constela o céu com o seu inquérito

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Dádiva

O sabor
O ardor
O amor a um algo puro e simples
Ventilando nossos poros e nossas sínteses
Biológicas
Fisiológicas
Físicas da química lógica e intermitente
Como uma loja de amores desobedientes
Que gozam
Que rogam
Que rezam para que o dia não amanheça
E, quem diria?, antes que o agora aconteça
Tentam sonhar
Tentam provar
Tentam parar de conhecer o nada
E descobrir tudo, cair numa estrada
Num futuro
De um pretérito
Imperfeito, para uma perfeição inconcreta
Completamente coesa e certamente
Incompleta

Escolares

Os olhares, a bandida visão
Que faz escapar, da mão, a perícia.
Sagaz o pensar, antemão à notícia
Dos pomares e da ardida canção.

Nossos lares, à medida que são
O ar e a constelação, a carícia,
Um mar de insatisfação, de malícia
Das várias investidas, da ilusão.

Mas a navegação do nosso interno
Espaço constante e eterno sinal
De esperança, de fogo, de nossa alma

Co'a calma que conduz tal fogo eterno
Desfaço o semblante de sombra e mal
E a criança, num jogo, levanta. Palmas!

sábado, 14 de dezembro de 2013

Conversa Entre um Defunto e Eros

Foram-se os anos dos meus desesperos
Da eternidade temos alguns anos
Para tu me explicares, caro Eros,
O efeito das paixões no ser humano

Eles caem, completamente insanos,
Quando o ser desejado diz "Eu quero"
E choram como as notas de um piano
Efêmeros amores, tão sinceros...

Que duram uma vida ou uma semana!
E abalam-nos n'alma da mesma forma
Quas maldições da tradição cigana

Eu mesmo, vivo, amei intensamente
E agora, morto, entender estas normas
Me faça, ao menos, deus indiferente!

Agora, Agira

A infância e seu doce sabor de mel
No passado, ao presente contesta
Enquanto errada, esta mente contrasta
Co'a ânsia de seus doces lábios, céu

Os risos sem mote e os motins sem réu
Capitães do universo que, a si, basta
Sem cores, méritos, moedas ou casta
Como sinto-me tirando teu véu

E são perversas razões da inocência
Que maculam o concubino ingrato
Antes de núpcias e da coroação

Diamantes lapidados na insolência
Carência do inocente, estupefato
Levando as crianças a saber quem são.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Luxo

Como lembranças ingratas,
As cores das gravatas
Amarram, consigo, o peso do cérebro sobre o homem
E enforcam.

Voltando ao ar, se transformam, nuas,
Douradas e azuis. Por todos os lados
Envolvem e desenvolvem.
E evoluem.

Cacofonicamente, elas só mentem.
Classificando-se, são recolhidas
Ao intenso e interno prazer rupestre
De tomar o corpo e roubar a vida.

Antes pulos, que sabiam o que fazer,
Agora muros, sem lugar ou pés pra ir
Agora nulos, até pular, até cair...
Antes não crer.

Mais absurdos que a morte em si,
Os ternos tomam o valor humano da dor,
Gritando: "Consumo pois devo!"
Atingindo o nervo das justas pessoas.

Constantemente roubam, matam, sofrem.
Até o anterior, fazia o impossível
Mas somente com o consentimento.
Agora, a rigor, crescia indivisível.

Meros prazeres que consomem a alma cadente,
(A carne e o osso nunca tão carentes,
A gula e a luxúria quase parentes de ventre!)
O luxo enche a bucha dos sem alma, pedindo-os que entrem entre suas nuances e cordas.

Mania dos distantes de procurar a cura onde há derrota, máxima e possante!
Porém é a derrota, da salvação, amante,
Uma vez que se constroem, igualmente
A partir da discórdia de nossa gente.

Embutindo a si mesmas o valor,
A fome, a peste, a raiva e a dor, ingratas,
Voltam-se aos seus formadores primatas
Depois de a mata não conter mais cor.

Quê?

Com o baque surdo,
Contemplando o absurdo de seu tempo e espaço,
Se constrói mudo.

Diferenciando-se dos ruídos, sem medo ou erro crasso
Absorve-se contente,
Sem ter na mente a primeira hipótese: não é audição, somente.

Contentes cérebros
Se transpõem ao olhar ao Cérbero dos mudos e cegos
Ao Julgamento

E são contentes por somente não ouvirem
Uma vez que
Pode-se produzir algo, só não pode absorver a resposta

Mas, uma vez falhando,
A boca impede o portador de soltar sua alma.
Mas tenhamos calma.

Não seria de suma importância uma boca ter,
Afinal,
Se usá-la para um peso morto, ao mundo, ser.

Cinco sentidos,
Sem sentido algum de ser a não ser a essência do mundo,
Nunca sentidos.

Escutar a resposta de um inimigo tão queridamente odiado
É tão necessário?
Tanto quanto ver seus miolos saindo às têmporas, assassinado?

Mas justos sejamos,
Não que os cincos vieram para o mal semearem, não.
Mas sofreram.

Sofreram a humana e terrena, porém simples, ilusão
De poder
E puderam crer que fariam diferença (ou não).

Doce emoção
Das mãos, pés e cabeças de mentes sem pé nem cabeça.
Que nunca cresçam!

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Mas Iria?

E voltou com toda a força.
Morreu com as cinzas de sua própria garganta, para então renascer numa cama de hospital.
Uma fênix ou um paciente terminal?
Entre a cruz e a foice ou entre o fogo e a forca?
Quando vai embora?
Se já foi, não faz falta.
Se não foi, falta ir para voltar quando fizer saudade.
Saudade passou, saudade de tudo, do nada absurdo e da insanidade.
Antes a morte que a culpa.
Antes o beijo que a morte.
Antes a culpa que o beijo.
Antes a vida que a sorte.
Que a sorte de pensamentos atando nós.
Com a forte lógica do momento insalubre, e sem vislumbre
Dos nós e teias que ateiam fogo na elite do "eu" e do "tu",
Tudo porque você não fez questão? Não, injustiça.
Justiça é, na verdade, a mentira.
Mentira.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Conclave

E não seria céu
Não seria inferno
Seria, sim, um ambiente puro e doce como o mel
Quase como o de um peito materno
Mas não é.

Seria a terra, o fogo e uma pitada de sal
Antes das luzes
Seriam o mal
Mas também seriam aquilo que espantam, as cruzes.
Seriam.

Poderia voar, poderia ser, poderia vingar.
Poderia amar.
Poderia matar.
Poderia se tornar aquilo que desejar, poderia se transformar.
Poderia.

Mas ainda que o poder e o ser
Não mais se disponham a, em si mesmos, crer
Ainda há de vir
A era do saber
Por mais que saber não seja crer nem ser, mas seja

Seja, veja. E a cerveja sorvida será doce aos lábios secos e sem vida,
O beijo, benção,
E o tapa, merecido (nem tão, assim, doído)
Enquanto se aparece à rima sofrida
A noite se comove com o dia, aprendendo a lição

Aprendendo a emoção do dia e noite
E sabendo
Que nada representa a escuridão de nossas almas como uma sombra.
Porém a maior sombra se traz
Com a maior luz. Sorte?

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

E As Orquestras

Às batidas do pêndulo e compasso
Do coração que constrói o aparato
O cantar da clara dama é só nosso
Enquanto livrarmo-nos dos estratos

E a neve dos claros olhos e traços
Que examinam, da orquestra, até os sapatos
Tece, de seu próprio amor, os frios laços
Até minar as frestas desses fatos

Enquanto acaba sua suave canção
Esquece o verão e traz primavera
Aos corações palpitantes, febris

Aquece o chão e a ele me traz, austera
E as cordas choram da emoção que fiz
E as orquestras, descalças, regem. São?

domingo, 1 de dezembro de 2013

A Breve Jornada do Longo Sonho

Contestando o pensar e o amor lírico,
O subconsciente se faz de um problema
Para curar-lhe de seu triste enema,
Atestando, amar, sim, somente o onírico.

Não encontrando, por dentro, algo empírico
Vê-se encontrado em um grave dilema
Desejando, então, criar um novo tema
Ao seu sonhar expresso e visto: um clínico

Mas as areias enganam seu mestre
Uma vez que quem nunca enfim acorda
Impõe a sim próprio a não-identidade

Rasgando, de si mesmo, as próprias cordas
Já não faz parte desta realidade
Só vê no espelho um vegetal, rupestre